Uma História de Amor – Capítulo 4

Capítulo 4 – Juntos e shallow now

PEDRO

Acordei com o braço formigando, estendido para fora do sofá. Ligo o celular e:

Alerta – Mensagem de Lucas:

“- Oi, Pedro. Desculpe ter sumido. Tudo bem contigo? Está livre este fim de semana?”

Eu começo a escrever umas três vezes e paro. Eu não quero responder tão prontamente: aquela lenda sobre não se mostrar tão disponível, sendo que o que eu queria mesmo era que ele me escrevesse.

– Oi, Lucas, tudo bem e você? Tenho uma gravação hoje, mas amanhã e sábado estou tranquilo.

A conversa engrenou, como se nós nos falássemos todos os dias.

– Certo. Pensei em assistir algum filme e jantar depois. O que acha?

– Ótimo! Sábado?

Porque sábado era um dia mais oficial para dates de interesse real. Pelo menos era o que me demonstrava a prática, em minha história de vida amorosa.

– Sábado. Perfeito. Podemos nos encontrar às 19h?

– Sim, sem problemas.

Marcamos num shopping que ficava razoavelmente próximo para ambos. Não gosto de dirigir e ele está sem carro na cidade. Então, pensamos num trajeto que ficasse fácil de Uber e claro, num lugar de gosto dos dois. Acabamos na região da Paulista, o típico lugar paulistano mais paulistano para os amantes da capital.

LUCAS

Eu pedi pipoca, porque adoro. O Pedro pegou só umas balas, de menta. Será que hoje rola beijo? Estou rindo sozinho com a piada dentro da minha cabeça. Ainda bem que o único a me julgar sou eu mesmo. E não o faço.

– Eu gosto desses lugares um pouco mais pra cima e centrais. Melhor pra ver.

– Sim, e para pessoas “altas” é sempre melhor – ironiza ele.

Rimos juntos, pois sou pouca coisa mais alto que ele. Então, a brincadeira acaba cabendo para mim também.

Enquanto passa o trailler e as propagandas, rimos de outras coisas, como por exemplo da quantidade de personalidades que o Pedro cita conhecer e alguns segredos de bastidores. Não que ele seja uma celebridade, entretanto, conhece muita gente em razão da divulgação de seu trabalho como escritor. Acho engraçado ele contar as coisas de forma tímida. Talvez não fosse o comportamento que eu esperasse de uma pessoa com tanta desenvoltura nos vídeos que assisti, dos podcasts que me atualizei dos quais ele participa. Às vezes comparo de forma errada desenvoltura e timidez.

– Você é simpático sim, mesmo com esse jeito tímido…Pipoca?

– Obrigado.

– Se quiser, só pegar. Antes que eu acabe com elas.

PEDRO

As luzes baixaram para o início do filme e eu ainda não sei se devo subir o braço da cadeira que nos separa. Tiro uma bala do bolso, coloca na boca. Não ofereço para o Lucas porque ele segue entretido com a pipoca.

Dessa vez escolhemos um filme de suspense e terror. A meu ver os gêneros hoje se fundem num só. E é engraçado como rimos das situações aflitivas no mesmo instante. De verdade, acredito que começa a acontecer uma melhor conexão.

Lá para a metade do filme, numa hora de menos luz e silêncio em cena, Lucas aperta minha coxa, num tom de brincadeira querendo me assustar. Seguro sua mão e rio. Não solto sua mão e ele parece não se importar com isso, o que é muito bom para ser sincero. Eu arrisco um carinho e de vez em quando ele aperta meus dedos e ri baixinho. Ah, se isso não é uma evolução, sou um Pokémon com Mercúrio retrógrado, o que quer que queira significar essa minha metáfora sem discernimento.

O jantar ficou por conta de uma típica fatia de pizza numa tradicional padaria 24 horas da Paulista, com direito a divisão de sobremesa para fechar a noite. Sem café e com um convite:

– Quer ir até em casa? Conversamos mais um pouco. A noite está sendo tão bacana.

– Perfeito – assenti – Vamos sim.

LUCAS

O Pedro aceitou ir em casa. Ponto positivo. A noite estava caminhando bem: conversa agradável, um jeito carinhoso e tímido que dessa vez me prendeu a atenção e me fez querer que não terminasse. Eu não queria ir embora sozinho.

– Então, vamos. Acertamos a conta e lar doce lar. Não repare a bagunça que houver.

– De jeito nenhum. Não sou tão detalhista.

Um escritor? Fato que veria cada detalhe fora do lugar e as coisas que encaixavam bem. Assim seria um cenário ideal, vida real com impressões reais. Aquela história de manter os pés no chão.

Pedimos o Uber e logo estávamos chegando ao meu apartamento, não muito distante dali.

– Bem-vindo a minha mansão.

Um apartamento studio, com pouca coisa fora do lugar. Usei do artifício da bagunça para superar uma expectativa maior.

– Muito bom! Os ambientes são bem integrados. Embora meu forte não seja arquitetura.

– Imagino que seja melhor em…

– Literatura.

Completando a frase do outro. Isso me pareceu um bom presságio para a continuidade da noite. Sinal de intimidade.

– E no que mais é bom?

– Beijos – Pedro respondeu e baixou um pouco os olhos.

Apoiei a mão em sua nuca e o beijei terna e longamente. Gosto de quero mais e doce como o do início de uma paixão. Acabamos deitados no sofá, com uma sequência calorosa de beijos e reconhecimento de nossos corpos, com delicadeza e afeto.

“Me agarro na tua nuca, daqui não largo nunca mais”, cantarolei baixinho em seu ouvido e continuamos na cama nosso caloroso e reconfortante reencontro, entregues ao ritmo único que nossas respirações tomavam entre um toque e outro, presente um para o outro, sem qualquer preocupação com o mundo lá fora – bem clichê e bem harmonioso. Parecia que nos conhecíamos há tempos e sabíamos como nos guiar.

PEDRO

Acordar envolto em seu abraço foi o melhor jeito de despertar no dia seguinte, com direito a beijo de bom dia, carinhos e organizar o café juntos, com a ajuda da cafeteira, das frutas da geladeira e de um pão de forma já aberto na véspera. Não estávamos querendo preparar um banquete. Apenas ter maior tempo juntos naquela manhã de domingo.

– Adorei nossa noite juntos – disse Lucas me olhando profundamente, o que assenti com um beijo no rosto.

– Ah, só um beijinho na bochecha?

Voltei e o beijei longamente, emaranhado em seus braços.

– Melhor? – ironizei, com um sorriso leve.

– Sempre.

E quem disse que domingos são monótonos?

– “Juntos e shallow now” – cantarolei e rimos praticamente no mesmo compasso.

(CONTINUA)

 

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